quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

O relógio e a ampulheta

Lá fora é breu, a noite é fria, escura e cinza
vejo nas frestas das cortinas entreabertas
enquanto me aquece o calor que emanana da lareira
e do aconchego dos parentes que a cercam

Nos seus olhos, enxergo o brilho da harmonia
e nos seus rostos, a sombra escura se desvanece
sorrisos largos, que há muito tempo se escondiam
ganham espaço pra explodirem em alegria

A porta fechada nos protege do silêncio
como as fitas de cetim, o conteúdo dos presentes
estes embrulhos só se rasgam na hora certa
enquanto cresce a curiosidade sobre ela

Poucos sabem dela, ou o motivo da insistência
que ela empenha no sumiço da existência
fato é que, ignoramos sua presença
pra suportar a dor que vem em nome dela

Mas hoje a dor está distante, entrou de férias
e ainda temos uns momentos que nos restam
por isso, o vinho está na taça que me serve
e os motivos de nosso choro são de festa

Enquanto abro caixas felizes que me deram
penso no que queria do conteúdo desses frascos
quem dera o presente nos fosse dado de presente
pra desfrutarmos outra vez do instante raro

As rugas mudam os principais significados
e as regras ficam mais exigentes com o empenho
diferentes daquelas que já estávamos acostumados
a burlar por motivos torpes que agora me escapam

Assim, os tique-taques mudam de instrumento
e de sentido, se observarmos com sutileza
uma hora a mais, no relógio antigo de parede
é um grama a menos na ampulheta sobre a mesa

Instante fugaz, contornos frágeis da eternidade
penso e desejo, como um conselho, para mim mesmo
que a gente saiba queimar o pavio do tempo escasso
ao lado de quem a gente ama de verdade

Enquanto se aproximam os lobos raivosos da saudade
ouço de longe seus uivos, e protejo a chama acesa
aqui dentro, o contentamento me ensurdece
aos silvos do vento, que anunciam a tempestade

André Patroni
Campo Grande, MS
08.12.2011

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